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México pode eleger 1ª juíza indígena em votação inédita após reforma do Judiciário

Silvia Rocio Delgado Garcia, candidata a juíza criminal pelo estado de Chihuahua, distribui panfletos de campanha -  Herika Martinez / AFP
Silvia Rocio Delgado Garcia, candidata a juíza criminal pelo estado de Chihuahua, distribui panfletos de campanha Imagem: Herika Martinez / AFP

01/06/2025 10h17

Neste domingo (1º), os mexicanos irão às urnas para eleger seus juízes e magistrados ? um pleito histórico no país. A votação ocorre após a aprovação de uma polêmica reforma judicial em setembro de 2024. Apesar da magnitude da mudança, o processo eleitoral gera pouca empolgação e é considerado complexo. O partido governista Morena, fundado por López Obrador e liderado por Claudia Sheinbaum, defende que a reforma serve para romper com um Judiciário "elitista, corrupto e distante da população".

Neste domingo (1º), os mexicanos irão às urnas para eleger seus juízes e magistrados - um pleito histórico no país. A votação ocorre após a aprovação de uma polêmica reforma judicial em setembro de 2024.

Apesar da magnitude da mudança, o processo eleitoral gera pouca empolgação e é considerado complexo. O partido governista Morena, fundado por López Obrador e liderado por Claudia Sheinbaum, defende que a reforma serve para romper com um Judiciário "elitista, corrupto e distante da população".

Durante sua tradicional coletiva de imprensa, a presidente mexicana Claudia Sheinbaum fez um apelo direto à população: "Participem, decidam quem serão seus juízes e magistrados!". A convocação ocorre em meio à reta final da campanha, que visa renovar todo o Poder Judiciário: estão em disputa 881 cargos, da Suprema Corte aos tribunais distritais.

No dia da votação, os eleitores receberão seis cédulas diferentes, cada uma representando um órgão judicial. Cada cédula tem uma cor distinta: roxo para a Suprema Corte, azul-marinho para a câmara superior do Tribunal Eleitoral, salmão para as câmaras regionais, rosa para os tribunais de apelação, amarelo para os juízes distritais e turquesa para o novo tribunal disciplinar, encarregado de supervisionar os demais.

Segundo a magistrada Janine Otálora, do Tribunal Eleitoral, o desafio é imenso: "Só para a Suprema Corte, são 64 candidatos disputando nove vagas. É impossível conhecer todos eles." O eleitor deverá preencher cada cédula individualmente, escolhendo entre dezenas de nomes, muitos dos quais são desconhecidos do grande público.

Segundo dados oficiais, cerca de 20% da população mexicana é composta por povos indígenas, mas a presença deles no Judiciário ainda é mínima. Embora o governo tenha alegado que a reforma daria mais espaço às minorias, na prática, os requisitos para concorrer (formação universitária em direito, cinco anos de experiência e boas notas acadêmicas) continuam a excluir grande parte dessas comunidades.

Uma reforma polêmica imposta no fim do governo López Obrador

A eleição é consequência da última grande iniciativa do ex-presidente Andrés Manuel López Obrador (2018-2024), aprovada poucos dias antes de deixar o cargo. A reforma judicial propôs a substituição do modelo tradicional de nomeações - baseado em indicações do Executivo e aprovação pelo Senado - por um sistema de votação popular direta para todos os níveis do Judiciário.

A mudança foi duramente criticada pela oposição, que organizou manifestações em várias cidades e convocou um boicote às urnas neste domingo. O argumento central é que a reforma politiza a Justiça e fragiliza sua independência.

"A campanha eleitoral por natureza exige seduzir eleitores - e um juiz não deve ter esse papel", alerta Janine Otálora. "Sem falar no risco de compra de votos e interferência do crime organizado, num país já tão vulnerável."

Restrições na campanha e desigualdades de o

Para evitar excessos, o Instituto Nacional Eleitoral (INE) impôs regras rigorosas: nada de cartazes, megafones ou propagandas em massa. Os candidatos só puderam fazer campanha por meio de panfletos e visitas domiciliares.

Essa limitação prejudicou candidaturas independentes e de minorias. Um exemplo é Camelia Gaspar Martínez, advogada indígena zapoteca de 38 anos, que disputa uma vaga no tribunal regional de Xalapa, responsável por sete estados do sul e sudeste do México.

Camelia percorreu milhares de quilômetros - às suas próprias custas - para fazer campanha. "Gastei todas as minhas economias. Se eu não vencer, vou precisar encontrar um emprego imediatamente para pagar as dívidas", contou. Em muitas comunidades por onde ou, ela era a única candidata a visitar os eleitores. "Eles dizem que vão votar em mim porque fui a única que apareceu."

Representatividade ameaçada pela ausência de cotas

Para a magistrada Otálora, a ausência de cotas obrigatórias para indígenas compromete o ideal de diversidade. "Sem um mínimo de vagas garantidas, dificilmente eles conseguem se eleger", afirmou. Camelia, no entanto, vê os dois lados da questão: "Já houve casos de pessoas que se dizem indígenas só para conquistar votos, mas depois de eleitas esquecem suas promessas."

Se eleita, Camelia se tornará a primeira mulher indígena a ocupar um cargo tão alto no Judiciário mexicano. "Seria um marco histórico. Seria a quebra de uma barreira que sempre nos impediu, enquanto mulheres indígenas, de ar esses espaços."

Baixa participação ameaça legitimidade

Outro fator que preocupa é a complexidade do processo eleitoral, que pode desestimular o comparecimento. "Ninguém conhece os candidatos. As regras são confusas. Os locais de votação são menos numerosos que numa eleição presidencial. Tudo isso afasta o eleitor", aponta Otálora. Segundo ela, se a participação não superar 30%, o processo será considerado um fracasso.

Uma pesquisa do instituto Enkoll divulgada pelo jornal El País e a rádio W Radio mostrou que 72% dos mexicanos apoiam, em princípio, a eleição direta de juízes. No entanto, a expectativa de comparecimento às urnas estava em apenas 22,9% na véspera da votação.

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