Brasileira tem fratura em montanha e é resgatada por recordista mundial
Faltavam apenas 20 metros para chegar ao cume do Pico de Itaguaré, na serra da Mantiqueira, quando a biomédica Caroline Toledo caiu de um paredão de 4 metros e sofreu fratura exposta na perna direita. Por ironia do destino (ou planejamento certeiro da atleta amadora), a equipe dela contava com o recordista mundial Maximo Kausch, e o alpinista, então, ajudou a liderar as 13 horas da expedição de resgate.
Caroline e o marido Caio começaram a praticar o alpinismo em 2015, no vulcão Cerro Toco, localizado no Chile a 5.600 metros de altitude. Após concluir a primeira expedição, eles se apaixonaram pelo esporte e aram a subir montanhas pelo mundo — uma delas foi o famoso Kilimanjaro, o ponto mais alto da África.
Nos últimos meses, eles estavam se preparando para a expedição de sete dias no Pico Lenin, uma montanha com pouco mais de 7.000 metros, localizada entre Quirguistão e Tadjiquistão. A travessia Marins-Itaguaré, na divisa de Minas Gerais e São Paulo, foi parte do roteiro que antecipava o alvo a ser atingido em agosto. Caroline e Caio aproveitaram o feriado do Dia do Trabalho para fazer o percurso de quatro dias e pouco mais de 2 mil metros de altitude.
"Domingo foi o último dia. Acordamos 3h30 para chegar ao cume do Itaguaré, tomar um café da manhã e começarmos a descida rumo ao fim de trilha. Faltavam uns 20 metros para esse cume quando fui escalar um paredão e desabei. Meu pé direito entrou em um buraco e acabou pendurado. Uma fratura exposta", descreveu Caroline.
Na mesma hora, Caroline se arrastou para uma pedra onde conseguia se sentar e chamou a turma que estava na sua expedição que, por sorte, tinha quatro médicos. Foi neste momento que o guia Maximo Kausch apareceu com outro grupo e resolveu ajudar. Argentino criado no Brasil, Max detém o recorde mundial do maior número de subidas em montanhas de 6 mil metros.
"Cortaram bota, meia e calça para fazer uma imobilização inicial com o que tínhamos lá. Estava muito frio, em torno de 3°C. Conseguiram fazer uma tala com um alumínio de uma das nossas mochilas, amarraram um agasalho e colocaram esparadrapo. Vestiram, também, a pontinha dos meus dedos com uma touca e embalaram com isolante térmico. Havia risco de necrose, afinal meu pé não estava bem vascularizado com a fratura", contou a biomédica.
Max colocou Caroline nas costas e o grupo partiu para uma caminhada de duas horas até um local onde os bombeiros conseguissem chegar para fazer o resgate de helicóptero. No percurso, a biomédica foi medicada e teve os sinais vitais monitorados por uma das médicas da equipe. Quando finalmente chegaram ao possível heliponto, os socorristas fizeram contato para avisar que não teriam condições de pousar devido às condições de visibilidade.
Foi nesse - e único - momento que Caroline desabou emocionalmente. Ela entendeu que a gravidade da lesão não a permitiria ir ao Pico Lenin em agosto. Ao mesmo tempo, a biomédica e a equipe tiveram de decidir seguir o resgate a pé, já que os bombeiros não conseguiriam chegar.
"Como o pé estava totalmente fora do lugar, eu estava com pouca vascularização na região dos dedos. E essa vascularização estava piorando. Existia um risco de perder os dedos, de entrar no processo de necrose. Então, eles optaram por tentar correr", falou Caroline.
Após 13 horas e meia de expedição, Caroline foi resgatada pelos bombeiros e pegou mais uma hora de estrada até chegar ao hospital mais próximo. Além da fratura, a biomédica estava desidratada e com hipoglicemia. Após o atendimento, o ortopedista de plantão indicou que ela deveria ir a São Paulo para fazer a cirurgia.
Antes de partir, Caroline foi medicada graças a uma anestesista que ou por ela e se compadeceu com a situação e tomou um banho oferecido por uma técnica de enfermagem. Ela já estava havia quatro dias sem jogar água no corpo, o que é normal durante as expedições. A diferença é que Caroline estava muito mais suja, porque precisou se arrastar na terra em alguns trechos.
Em São Paulo, a biomédica ficou internada e fez duas cirurgias, uma delas de oito horas para corrigir fraturas em diferentes lugares, além do rompimento de três ligamentos e um tendão.
"A expectativa para eu voltar a colocar o pé no chão é daqui a seis semanas. Voltar a andar mesmo, sem muleta, vai ser mais ou menos daqui a uns três meses. Voltar a fazer esporte como eu fazia antes, o médico acredita que serão seis meses. Então é um longo caminho", destacou Caroline.
O caminho é longo e atropelou o planejamento de Caroline para a expedição ao Pico Lenin. A biomédica, porém, foca nos lados positivos. Ela se alegra ao receber mensagens de apoio e de iração por toda a valentia durante o resgate e celebra o fato de ter escapado de lesões ainda mais graves, que poderiam deixá-la sem andar para sempre.