Milícia apoiada pela China garante controle de novas minas de terras raras em Mianmar
Por Naw Betty Han e Shoon Naing e Devjyot Ghoshal e Eleanor Whalley e Napat Wesshasartar
BANGCOC (Reuters) - Uma milícia apoiada pela China está protegendo novas minas de terras raras no leste de Mianmar, de acordo com quatro pessoas familiarizadas com o assunto, conforme Pequim se movimenta para garantir o controle dos minerais que está usando como moeda de troca em sua guerra comercial com os Estados Unidos.
A China detém um quase monopólio sobre o processamento de terras raras pesadas em ímãs que alimentam produtos essenciais como turbinas eólicas, dispositivos médicos e veículos elétricos. Mas Pequim depende muito de Mianmar para obter os metais e óxidos de terras raras necessários para produzi-los: o país devastado pela guerra foi a fonte de quase metade dessas importações nos primeiros quatro meses deste ano, segundo dados da alfândega chinesa.
O o de Pequim a novos estoques de minerais, como disprósio e térbio, foi recentemente limitado depois que um importante cinturão de mineração no norte de Mianmar foi tomado por um grupo armado que luta contra a junta do país do sudeste asiático, apoiada por Pequim.
Agora, nas encostas do Estado de Shan, no leste de Mianmar, mineradores chineses estão abrindo novos depósitos para extração, de acordo com duas das fontes, ambas trabalhando em uma das minas. Pelo menos 100 pessoas estão trabalhando em turnos diurnos e noturnos escavando encostas e extraindo minerais usando produtos químicos, disseram as fontes.
Dois outros moradores da região disseram ter visto caminhões transportando material das minas, entre as cidades de Mong Hsat e Mong Yun, em direção à fronteira com a China, a cerca de 200 km de distância. A Reuters identificou alguns dos locais usando imagens dos fornecedores de satélites comerciais Planet Labs e Maxar Technologies.
Os registros comerciais em Mianmar são mal mantidos e de difícil o, e a Reuters não conseguiu identificar de forma independente a propriedade das minas.
As minas operam sob a proteção do United Wa State Army, de acordo com quatro fontes, duas das quais conseguiram identificar os uniformes dos membros da milícia.
O UWSA, que está entre os maiores grupos armados do Estado de Shan, também controla uma das maiores minas de estanho do mundo. Ele tem vínculos comerciais e militares de longa data com a China, de acordo com o Instituto da Paz dos EUA, uma organização sem fins lucrativos de resolução de conflitos.
Detalhes sobre o papel da milícia e a rota de exportação das terras raras foram relatados pela Reuters pela primeira vez.
Patrick Meehan, professor da Universidade de Manchester, que estudou de perto o setor de terras raras de Mianmar e analisou imagens de satélite das minas de Shan, disse que os locais de "tamanho médio-grande" parecem ser as primeiras instalações significativas no país fora da região de Kachin, no norte.
"Há um cinturão inteiro de terras raras que a por Kachin, Shan e partes do Laos", disse ele.
O Ministério das Relações Exteriores da China disse, em resposta às perguntas da Reuters, que as empresas chinesas que operam no exterior são obrigadas a "obedecer às leis e regulamentações locais e cumprir ativamente suas responsabilidades sociais".
O UWSA e a junta não responderam aos pedidos de comentários.
O o às terras raras é cada vez mais importante para Pequim, que aumentou as restrições às suas exportações de metais e ímãs depois que o presidente dos EUA, Donald Trump, retomou sua guerra comercial com a China este ano.
Embora a China pareça ter aprovado recentemente mais exportações e Trump tenha sinalizado um progresso na resolução da disputa, a medida abalou as cadeias globais de oferta centrais para as montadoras de automóveis, fabricantes aeroespaciais e empresas de semicondutores.
O preço do óxido de térbio subiu mais de 27% nos últimos seis meses, segundo dados do Shanghai Metals Market. Os preços do óxido de disprósio flutuaram bastante, subindo cerca de 1% durante o mesmo período.
INFLUÊNCIA CHINESA
Uma clareira circular proeminente aparece pela primeira vez em abril de 2023 nas colinas florestadas do Estado de Shan, a cerca de 30 km da fronteira com a Tailândia, de acordo com as imagens de satélite analisadas pela Reuters.
Em fevereiro de 2025 - pouco depois que as minas de Kachin suspenderam o trabalho - o local abrigava mais de uma dúzia de piscinas de lixiviação, que são lagoas normalmente usadas para extrair terras raras pesadas, mostraram as imagens.
A seis quilômetros de distância, do outro lado do rio Kok, outra clareira na floresta foi capturada em imagens de satélite de maio de 2024. Em um ano, ela havia se transformado em uma instalação com 20 piscinas de lixiviação.
O analista de minerais David Merriman, que analisou duas das imagens da Maxar para a Reuters, disse que a infraestrutura nas minas de Shan, bem como os níveis de erosão observáveis na topografia, indicam que as instalações "já estão produzindo há algum tempo".
Pelo menos uma das minas é istrada por uma empresa chinesa com gerentes que falam chinês, de acordo com os dois trabalhadores da mina e dois membros da Shan Human Rights Foundation, um grupo de defesa que identificou a existência das operações em um relatório de maio usando imagens de satélite.
Um escritório em um dos dois locais também tinha um logotipo da empresa escrito em caracteres chineses, disse um dos trabalhadores, que falou sob condição de anonimato para discutir assuntos delicados.
O uso de operadores chineses nas minas de Shan e o transporte da produção para a China espelham um sistema semelhante em Kachin, onde encostas inteiras estão marcadas por poças de lixiviação.
As empresas de mineração chinesas podem produzir óxidos pesados de terras raras em Mianmar --de baixo custo e pouco regulamentado-- sete vezes mais barato do que em outras regiões com depósitos semelhantes, disse Neha Mukherjee, da Benchmark Mineral Intelligence, com sede em Londres. "As margens são enormes."
Pequim controla rigidamente a tecnologia que permite a extração eficiente de terras raras pesadas, e ela disse que seria difícil operar uma instalação em Mianmar sem a assistência chinesa.
As imagens de satélite sugerem que as minas de Shan são menores do que as de Kachin, mas é provável que produzam os mesmos elementos, de acordo com Merriman, que atua como diretor de pesquisa na consultoria Project Blue.
"Os depósitos do Estado de Shan terão térbio e disprósio, e esses serão os principais elementos que (os mineiros) estão buscando lá", disse ele.