Bolsonaro nega golpe, critica urna eletrônica e até brinca com Moraes
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) negou qualquer tentativa de golpe de Estado em depoimento no STF (Supremo Tribunal Federal). Ele justificou como "retórica" e pediu desculpas. Ainda conseguiu fazer piada e rir com o ministro Alexandre de Moraes.
O que aconteceu
Bolsonaro se justificou sobre as críticas ao sistema eleitoral e ao Judiciário falando em retórica e desabafos. O ex-presidente negou ter indícios para as acusações feitas a ministros do Supremo. "Era um desabafo, uma retórica que não era para ter sido gravada. O senhor me desculpe", afirmou.
Segundo ele, houve "má-fé" no vazamento das imagens da reunião. Nela, o ex-presidente e seus auxiliares discutem a possibilidade de uma ruptura democrática. Ele negou também que tenha sido alvo de qualquer ameaça de prisão durante as reuniões realizadas com comandantes militares.
Bolsonaro confirmou que a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), hoje foragida, levou o hacker Walter Delgatti Neto para uma reunião. "Eu o recebi, mas não senti confiança nele", afirmou o ex-presidente.
Ele questionou decisões do TSE que afetaram sua campanha. O tribunal não permitiu que ele usasse imagens do 7 de Setembro de 2022 e do funeral da rainha Elizabeth. A corte eleitoral viu abuso de poder nesse caso.
Bolsonaro disse que quis proteger as urnas. "Meu objetivo sempre foi mais uma camada de proteção das eleições de modo que evitasse qualquer conflito, qualquer suspeição. A intenção minha não é desacreditar, sempre foi alertar."
Bolsonaro é acusado de liderar toda a organização, montada para mantê-lo no poder mesmo depois da derrota nas eleições de 2022. Segundo a PGR, o ex-presidente fez vários discursos para desacreditar o processo eleitoral e desgastar a imagem das instituições junto à população, coordenar ações de interferência das eleições, como as blitze da PRF, além de conhecer o plano "Punhal Verde e Amarelo", que previa o assassinato do presidente Lula, do vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Teve brincadeiras e descontração no depoimento. Bolsonaro perguntou: "Posso fazer uma brincadeira?". Moraes respondeu: "O senhor que sabe. Eu perguntaria aos seus advogados antes", disse, bem-humorado. O ex-presidente, então, prosseguiu: "Eu gostaria de convidá-lo para ser meu vice em 26", afirmou, rindo. O ministro retrucou: "Eu declino".
Jair Bolsonaro levou um exemplar da Constituição para a oitiva. "Eu sempre joguei nas quatro linhas da Constituição", se defendeu, acrescentando que essa narrativa sobre as urnas sempre foi um tema levantado por ele. Ele usou uma fala antiga do ministro Flávio Dino, em que questionou a lisura das urnas eletrônicas quando concorreu às eleições para governador do Maranhão.
As blitze do segundo turno não impediram eleitores de votar, disse Bolsonaro. Ele afirmou que não tinha consciência da operação da PRF (Polícia Rodoviária Federal) que teria buscado atrasar e impedir a chegada de eleitores em suas seções. Ele disse que "nenhum eleitor deixou de votar nessas regiões".
Não havia da nossa parte uma gana de procurar, vamos supor que viéssemos a encontrar remotamente algo na Constituição, não existia essa vontade. O sentimento de todo mundo é de que não tínhamos mais nada que fazer. Então, tínhamos que entubar o resultado das eleições. Vossa Excelência pode perguntar: 'Por que não ou faixa?'. Eu não ia me submeter à maior vaia da história do Brasil.
Golpe é uma coisa abominável. O golpe até seria fácil começar. O 'after day' que é simplesmente imprevisível e danoso para todo mundo. O Brasil não poderia ar por uma experiência dessa. E não foi sequer cogitado essa hipótese de golpe no meu governo.
Jair Bolsonaro durante o depoimento ao STF
Como foram os outros depoimentos
Mauro Cid, delator
O tenente-coronel confirmou tentativa de golpe, mas negou participação. Ele disse que "presenciou grande parte dos fatos", mas não tomou nenhum atitude golpista.
Ainda acusou Bolsonaro de ter "recebido e lido" a minuta do golpe. O tenente-coronel disse que ele fez alterações no documento e "deu uma enxugada" para retirar a parte que pedia a prisão de autoridades, deixando somente Moraes.
Alexandre Ramagem, ex-chefe da Abin
Deputado itiu que não há provas de fraudes nas urnas. Ele argumentou que fazia anotações "privadas" sobre alguns assuntos para organizar suas ideias, mas não enviava ao então presidente Bolsonaro.
Moraes questionou se Ramagem havia usado a agência para monitorar ministros do STF. "Nunca utilizei monitoramento algum pela Abin de qualquer autoridade", respondeu.
Almir Garnier, ex-comandante da Marinha
Sem minuta. Disse não ter visto documento sobre ruptura institucional e negou ter colocado tropas à disposição de Jair Bolsonaro.
Confirmou reunião com Bolsonaro. Ele itiu um encontro no dia 7 e 14 de dezembro — este último, segundo ele, com os comandantes das Forças se encerrou rapidamente. Mas "não houve apresentação de documento durante a reunião".
General Augusto Heleno, ex-chefe do GSI
Ele usou o direito de permanecer em silêncio e não respondeu às perguntas de Alexandre de Moraes, só as de seu advogado. Foi o primeiro a ficar calado.
O general negou saber sobre plano em que se planejava um gabinete após a ruptura institucional. Ele ficaria a cargo desse comando. Também descartou qualquer tentativa de sair das quatro linhas da Constituição, que ele chamou de "lema do governo Bolsonaro".
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do DF
Disse que houve "falha grave na aplicação de protocolo em 8/1". Ele estava em viagem na Disney naquela ocasião. "Viajei adotando todas as providências que o secretário de Segurança Pública tem que tomar" e "nada indicava invasão de manifestantes dos acampamentos".
Ele chamou a minuta do golpe encontrada em sua casa de "minuta do Google". Negou ser o autor do documento. Disse ainda que havia erros de português e que ela estava em sua casa para ser descartada.